Começou cedinho o dia "D" para a armada vitoriana.
O desembarque das tropas sadinas no areal da Figueira da Foz teve início por volta do meio da manhã.
À medida que iamos chegando à Figueira da Foz, o cenário era de arrepiar: por tudo o que era sítio se viam famílias de branco e verde trajadas, os automóveis decorados a rigor espalhados por todas as artérias e recantos da cidade, cafés e restaurantes apinhados de setubalenses e vitorianos, piqueniques na praia com fogareiros, a bela esquilha e os indispensáveis garrafões de 5 lts, tudo isto pincelado de verde e branco, num cenário e ambiente que só quem lá esteve é que acredita. Jovens e velhos, ricos e pobres, homens e mulheres, todos comungando do mesmo ideal, todos unidos pelo mesmo emblema: o do Vitória Futebol Clube, maior embaixador da cidade à beira Sado nascida.
Após uma chegada à Figueira arrepiante, ultrapassadas as primeiras emoções do dia e após um farto e bem regado repasto, com o Mondego como companheiro, a fazer lembrar o Sado, chegava a hora de nos encaminharmos para o Estádio.
Entre o staff vitoriano a confiança reinava e a sensação de alívio nos rostos de alguns dos dirigentes era já evidente. Carlos Carvalhal, bem disposto, com um ar sereno, patenteava confiança e tranquilidade. Entre os atletas a concentração e confiança que se podia ler nos olhos dos jogadores, não deixaram dúvidas. A festa da subida seria no Municipal Bento Pessoa.
Nas bancadas também não havia dúvidas. Com um ambiente e uma atmosfera fantásticas, os adeptos do Vitória encheram por completo a superior, parte da central e tiveram a primeira grande demonstração de carinho quando os jogadores sairam para aquecimento.
Pedro Proença, o tal que antes dos jogos se besunta com gel, nunca apitara uma vitória do Vitória. Vaidoso e protagonista, durante o aquecimento respondia com acenos e sorrisos para a torcida vitoriana, com os aplausos e os insultos que lhe eram dirigidos pelos adeptos do Vitória.
Às 16h00 em ponto de uma tarde quente, e que viria a revelar-se histórica, o jogo, o ataque começara.
O Vitória entrou decidido a ganhar o jogo e a fazê-lo cedo, enquanto a Naval 1º de Maio entrou decidida a evitar a festa no seu quintal. Porém, na primeira parte só deu Vitória e por culpa dos comandados de Carlos Carvalhal, que, não dando a mínima hipótese aos médios navalistas de colocarem a bola no ataque com perigo, muito por culpa dos enormes pulmões de Sandro e Zé Pedro, delineavam e desferiam bem desenhados ataques, (o triângulo Hélio, Jorginho e Meyong foram uma constante dor de cabeça para a Naval) que só por infortunado acaso não permitiram ao Vitória inaugurar mais cedo o marcador.
Seria o minuto 38 que ficaria guardado para sempre no álbum de memórias e no livro da História do Vitória. Sandro perde, infantilmente a bola no meio campo e com um querer, uma força e uma coragem enormes, volta a recuperá-la de forma espectacular, endossa-a a Hélio, que como se munido de régua e esquadro, faz uma abertura de génio, na esquerda para Meyong. O camaronês esguio e veloz arranca para a linha e centra com precisão, rasteiro para o coração da área onde aparece Jorginho, que tapado por um adversário e num rasgo de magia ilude o seu oponente saltando por cima da bola, deixando-a ir parar direitinha a Manuel José, que solto de marcação se deparou a escassos metros da baliza, apenas com o guardião pela frente e atirou a contar para o Vitória. Estava feito o golo que recolocava o Vitória no escalão maior do futebol português.
Os adeptos gritaram golo das profundezas da alma e a euforia reinante contagiava toda a gente que a testemunhava. Homens e mulheres beijavam-se, amigos abraçavam-se, crianças atiradas ao ar e todos gritavam: VITÓRIA!! VITÓRIA! VITÓRIA!
Na segunda parte a euforia reinante dos adeptos não contagiou os jogadores, que tiveram até final de se manter altamente concentrados e empenhados, para fazer face à ofensiva dos homens da Naval que se mostraram bastante determinados a estragar a festa aos milhares que viajaram de Setúbal.
Fruto de uma linha atacante rápida, os comandados de Guto Ferreira ( ausente no Brasil), não deram, durante quase toda a segunda parte, descanso à defensiva vitoriana, provocando calafrios e valentes sustos aos cardiacamente debilitados adeptos setubalenses.
O Vitória, apesar de atento às investidas contrárias junto da baliza de Tigrão, nunca se retraiu e continuou na busca do golo da confirmação, que esteve perto por várias ocasiões. Bruno Ribeiro após boa combinação com um colega desfere um remate forte, que esbarra na base do poste da baliza de Dany. Na resposta, Oliveira, avançado possante, acabadinho de entrar, proporciona a Roberto " Tigrão" a defesa da tarde. Zé Pedro, já perto do final, ainda ameaçou marcar, com um fantástico remate de longe que saiu por cima, a rasar a barra, causou a última sensação de golo entre a comitiva vitoriana.
A vitória dos de verde e branco não merece contestação, mas louve-se a postura da Naval 1º de Maio, que tudo fazendo para não perder o jogo, só dignificou, valorizou e engrandeceu o esforço, a importância e a qualidade da vitória do nosso Vitória.
Decorridos os 4 minutos de compensação, Pedro Proença finalmente apitou e o Vitória podia então festejar e celebrar o merecido regresso ao convívio dos grandes, donde canalhamente fora arredado na época transacta.
No relvado, os jogadores do Vitória rejubilavam. Uns ajoelhados de mãos na cara, outros de mãos para o céu, alguns saltavam e pulavam de esfusiante alegria, abraçando-se e beijando-se, comemorando o triunfo como lhes mandava o sentimento.
Nas bancadas, a explosão, no momento do apito final, fez-se ouvir até à praia. Homens e mulheres, míudos e graúdos empunhavam, acenando, os seus cachecois e bandeiras, gritando a plenos pulmões "Vitória! Vitória!", ao mesmo tempo que lhes rolavam pela face lágrimas de inenarrável felicidade.
No relvado, técnico, dirigentes, atletas, staff médico, roupeiros abraçados, vinham comemorar e celebrar para junto dos milhares de adeptos, genuinamente felizes e contentes.
Foi uma festa bonita, a que foi feita nas bancadas do Municipal Bento Pessoa, ontem transformado em Estádio do Bonfim, por parte dos adeptos sadinos, onde, os que tivemos o privilégio de testemunhar esta subida, durante os gritos de Vitória! Vitória!, quando as lágrimas teimavam em cair, quando se vitoriavam os vencedores, não deixámos de fazer o balanço desta sofrida época para a família vitoriana, todos os obstáculos e provas que se nos depararam, todas as adversidades ultrapassadas, e concluir que valeu a pena acreditar, quando muitos deixaram de o fazer, valeu a pena incentivar, valeu a pena ser sempre só do Vitória, valeu a pena crer na força da família vitoriana, valeu a pena acreditar nos homens e mulheres que no dia a dia dão o seu melhor pelo clube.
Vale a pena ser do Vitória e foi isso que ontem, vi estampado nos rostos das crianças, que com ar triunfante e orgulhoso envergavam as vestes do Vitória Futebol Clube.
Finda a festa no Bento Pessoa, o impressionante mar de gente que pintava, de verde e branco, toda a alameda circundante ao estádio, reavivou seguramente muitas memórias de outras deslocações históricas do Vitória.
Até Setúbal, foi pintar a A1 com as cores e os símbolos do VFC e desaguar na Praça do Bocage, onde a cidade em festa há muito já esperava pela chegada da comitiva.
Já passava das dez da noite, quando, para júbilo dos milhares presentes e em completo delírio, o autocarro, transportando os jogadores e dirigentes se acercou das portas do Município, debaixo do coro de Vitória! Vitória!
Na varanda da edilidade setubalense, os jogadores e técnicos tiveram oportunidade de saudar os largos milhares que inundaram a Praça do Bocage e disfrutaram seguramente de uma manifestação de carinho, que para sempre perdurará nas suas memórias.
Usaram da palavra o Presidente do Município, Carlos Sousa, que saudou e parabenizou o Vitória e a cidade pelo merecida promoção, o capitão Hélio, que dedicou a subida aos adeptos e colegas de equipa num discurso sempre mais sentido, que correcto, Carlos Carvalhal confirmou que esta fantástica massa adepta faz do Vitória um dos grandes e deixou agradecimentos aos seus jogadores, administradores e ao Presidente da Assembleia Geral pelo inexcedível apoio prestado e deixou no ar um cheirinho a despedida. A terminar o Presidente do Vitória, Chumbita Nunes congratulou-se por sempre ter tido razão ao longo das escolhas feitas durante a época e revelava-se particularmente feliz, com o cumprimento de uma promessa eleitoral fulcral: " Unir o Vitória e os vitorianos".
Pela noite fora, os festejos prolongaram-se pelos bares de toda a cidade, com os jogadores, dirigentes e adeptos a conviverem até altas horas da madrugada no bar de um conhecido vitoriano, depois de magnânimo e animado jantar no amigo Teixeira.
O Vitória está unido, está no lugar que lhe pertence por direito e que, novamente, com muito sangue, suor e lágrimas, teve de o provar nos relvados, dando assim ao futebol português e ao País, em ano de Euro2004, a demonstração cabal que em Setúbal e no Vitória, por muito que nos empurrem, por muito que nos tentem derrubar, jamais nos vergarão. E a lição espero que esteja definitivamente dada.
Na próxima semana será o último jogo da época, a missão está cumprida e espera-se casa cheia para a grande festa vitoriana, que servirá de verdadeira consagração de um grupo de trabalho, que apesar de tudo, cumpriu, no essencial, os objectivos delineados no início da época.
Primeiro celebrar e festejar esta merecida vitória e depois, com serenidade e muito apoio, preparar as condições e estabelecer as fundações que permitam ao Vitória nunca mais ter de passar por tão penosa estadia no escalão secundário.
A todos os que tornaram possível a subida de divisão e a todos os que sentem o Vitória como seu, os meus sinceros Parabéns e o meu mais profundo agradecimento.
Viva o Vitória
Spry
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